segunda-feira, 30 de agosto de 2010

Já eleita, Dilma Rousseff pode não ter a mesma sorte de Lula

Lula teve sorte de suceder este homem.
NUMA ENTREVISTA À FOLHA de hoje, um economista de Harvard faz uma reflexão primorosa e desapaixonada sobre o Brasil.

Lula, diz ele, teve a sorte de suceder um presidente excelente. Dilma não terá a mesma sorte.

Fernando Henrique, a quem a posteridade haverá de conceder a merecida estatura na história brasileira, fez o Plano Real, que recolocou o Brasil no mapa do mundo. Ali, encerrava-se o ciclo de planos econômicos mirabolantes que tinham tornado o país motivo de chacota. Mudava-se a moeda, tiravam-se os zeros, tabelavam-se os preços — e em tempo recorde tudo estava como antes. Ou pior.

Sem estabilidade a vida de um país é ruim, bem como a de seus cidadãos. Os mais jovens não sabem o que é ter que aplicar no mesmo dia o dinheiro do salário porque no dia seguinte a inflação já teria comido uma parte. Quem tirou esse pesadelo da rotina dos brasileiros foi Fernando Henrique Cardoso. Ele teve um gigante ao lado na economia, Pedro Malan. Malan teria sido o nome ideal para continuar a obra de Fernando Henrique. Mas tinha a virtude de não ter os defeitos dos políticos, e por isso suas chances de suceder Fernando Henrique foram trucidadas por Serra no interior do PSDB.

O melhor que Lula fez foi não fazer nada. Se se deixasse levar pelos remanescentes da Guerra Fria que dominavam o PT, a começar por Zé Dirceu e continuando pela própria Dilma, estaríamos de novo esperando alguns anos para comprar um aparelho de telefone das estatais. Nosso dinheiro também seria torrado por bancos públicos como o Banespa, dominados por políticos com escassa preocupação pelo bem público.

Lula não fez nada que ameaçasse a estabilidade. A grande dúvida é se não foi um Chávez em grande escala por convicção ou por temer que fosse derrubado caso seguisse a cartilha do velho PT.

Mesmo a relativa tranquilidade com que o Brasil se houve na crise financeira foi mérito muito mais de FHC do que de Lula. Quem plantou um sistema financeiro forte foi a gestão anterior, num plano que foi massacrado demagogicamente pelo PT como uma proteção para os banqueiros. Era o Proer, que varreu bancos que estavam à beira de quebrar e gerar pânico entre seus correntistas. Houve aí uma consolidação financeira que deu a Lula tranquilidade quando ele mais precisou de solidez nos bancos, no momento em que colossos caíam no mundo desenvolvido.

A biografia preciosa de FHC foi parcialmente manchada, pós-presidência, pela mala vermelha com a qual ele tanto viajou para fazer palestras milionárias. Nelas ganhava numa ou duas horas o que levava um ano para levantar como presidente da República. É aquele tipo de coisa que não é ilegal sem ser defensável moralmente. Entre os britânicos, Tony Blair é desprezado pela sede com que se atirou às palestras depois de deixar Downing Street. Recentemente, ele doou o adiantamento calculado em 4,6 milhões de libras que recebeu por um livro de memórias. Esse dinheiro vai para os soldados britânicos feridos na Guerra do Afeganistão. Um dos comentários mais amenos sobre esse gesto — mais de marketing do que de filantropia — foi que finalmente Blair fazia alguma coisa que prestasse.

FHC deve ter cruzado em algum momento com Blair no circuito internacional de palestras.

Mas é tão grande sua obra na reconstrução do Brasil que este pecadilho da ganância fica pequeno diante do resto.

matéria retirada do diariodocentrodomundo.com.br

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